segunda-feira, 27 de outubro de 2014

F1 - Uma crise mais grave do que se pode imaginar.

foto: XPB Images
Foi confirmado hoje que a Marussia está na "corda bamba". A equipa anunciou a falta de investimento do principal accionista, o que coloca a equipa numa situação complicada. A Marussia não irá para os EUA, juntando-se assim à Caterham neste triste lote. Serão menos 4 carros no grid no próximo fim-de-semana. A participação nas últimas provas do ano para estas duas equipas está seriamente colocada em risco. Mas a situação pode ser bem mais grave.

Os problemas financeiros da F1 já são há muito falados e podem parecer anedóticos quando se fala de uma modalidade que movimenta milhões. Mas tal como no resto do mundo, o grande defeito da F1 é ter o poder demasiado concentrado e esse poder apenas ver uma coisa… o seu próprio proveito. Já há muito que batalho neste tema e a conclusão é sempre a mesma. Quem manda tem de dar lugar a sangue novo, ideias novas. Pois o que se está a passar agora é apenas a ponta do Iceberg.


foto: XPB Images
Bernie Eclesttone anda na F1 desde os anos 70. Um simples vendedor de carros passou a ser dono de uma equipa de F1 e agora é o “todo-poderoso”. No seu reinado, Bernie deu as equipas os direitos televisivos, aumentou a segurança da modalidade e exponenciou o potencial económico de forma brutal. Mas Bernie anda nisto há muito tempo. E tem posições inflexíveis, que agora diminuem o potencial da F1. A ideia estúpida de não apostar nas redes sociais é castradora em muitos sentidos. O MotoGP é um dos melhores exemplos. Todos os conteúdos estão disponíveis no site e fazem que os fãs tenham acesso directo e facilitado ao que querem ver. Retirar a F1 de onde há fãs para onde há apenas dinheiro é também absurdo. O GP do Azerbaijão era algo que ninguém conseguira imaginar há uns anos atrás. Quem vai pagar bilhete para ir ver um GP ao Azerbaijão?

Além disso, tivemos de passar a aturar emissões em canais fechados, e temos de engolir esta espécie de lei da rolha que diz que só o que o tio Bernie quer é que se pode ver. E para isso tem de se pagar. Caso contrário é tudo banido e escondido.

foto: XPB Images
Façam um teste. Perguntem porque os vossos amigos deixaram de ver F1. Duas respostas surgirão. Ou “desde que o Senna morreu nunca mais foi o mesmo”, ou “desde que passou para o canal fechado nunca mais deu jeito ver”. A perda do grande Senna é irreparável. Mas qualquer desporto já perdeu ícones e nunca perdeu fãs. Porque esteve sempre disponível. O grande problema da F1 é que deixou de estar acessível a todos. E as pessoas são “preguiçosas” por natureza. Se o conteúdo não for de fácil acesso não vêm. E acreditem se voltarem a ver, o “bichinho” volta a crescer. Mas como não vêm, não se interessam. Não é por falta de espectáculo que a F1 perde audiências, principalmente este ano.

Todo este elitismo, todas estas dificuldades de acesso a conteúdos tornam a F1 menos atractiva ao público e a investimentos. Grandes marcas, que poderiam investir no grande circo, não o fazem porque acham que a visibilidade que obtém não é suficiente para os preços que as equipas exigem. Hoje em dia só se vêm marcas de luxo, cujo acesso está confinado a um público muito restrito. Só este ano a Martini e a Smirnoff resolveram apostar, no que pareciam ser um balão de ar fresco.

foto: XPB Images
Mas é pouco. As equipas gastam cada vez mais e precisam de mais dinheiro. Mas com a filosofia seguida por Bernie, isso nunca acontecerá. Resultado? A Caterham vai fechar as portas (não é confirmado mas é um cenário mais que certo), a Marussia vai pelo mesmo caminho, e equipas como Sauber, Force India ficam numa situação muito complicada. Ficamos então com um grid reduzido a metade, onde agora a ideia passa por colocar 3 carros por equipa. É uma solução quer se goste ou não mas não creio que favorece a F1.

Mas o pior nem é isso. O pior é ver modalidades que antes eram consideradas secundárias a ganharem mais relevo. O WEC é exemplo disso. Cada vez mais marcas e equipas estão interessadas. O DTM vai pelo mesmo caminho não tarda. Até o WTCC está em vias de ver mais equipas. Mais equipas trazem mais competição. Mais visibilidade, implica mais investidores e mais publicidade. Mais publicidade traz mais dinheiro. É na variedade que estas modalidades se vão apoiando para crescer. Variedade que é cada vez mais escassa na F1. Ninguém pense que é por acaso que as marcas estão de volta em força para apostar em WTCC, WRC, WEC etc. Há vontade de voltar a competir por parte das marcas históricas. Tem é de haver um retorno para que isso aconteça. E na F1 isso é muito difícil de acontecer. Cada vez mais. E as marcas vão para onde consigam esse retorno.


foto: XPB Images
Há algum tempo ouvia-se que esta crise poderia ser o fim da F1. Hoje os arautos da desgraça ganharam mais um ponto a favor deles. Não acredito que a F1 vá acabar a curto ou até mesmo médio prazo. Tem demasiada história para isso. O único receio é que a modalidade siga um caminho que deixe de ser atractivo. Não faltam opções para os fãs de desportos motorizados passaram o fim-de-semana. Se a F1 quer ser mesmo a categoria rainha, tem de mudar de filosofia. Tem de mudar a forma como se abre para o mundo. Se continuar no seu “castelo” à espera que os interessados entrem… as pessoas poderão virar-se para outros lados. E então aí sim… a F1 deixará de fazer sentido. 

É preciso repensar a distribuição dos prémios às equipas, é preciso repensar nos gastos que as equipas fazem, é preciso começar a focar mais no adepto da modalidade e não no rico que vai ver uma corrida por ano e nem faz ideia de quem são os pilotos. É preciso tornar a modalidade competitiva e dar as equipas as ferramentas para isso. É preciso trazer as corridas para onde há fãs, é preciso abrir os conteúdos a quem os queira ver, mesmo que sejam meros curiosos. O futuro da modalidade depende disso.



Fábio Mendes

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