sexta-feira, 23 de maio de 2014

Antigamente é que era! Se calhar não. O que realmente mudou?

Sou acusado frequentemente de ter uma visão demasiado protectora da F1. Serão muito poucos os que concordam com esta revolução na F1. Eu concordo. Serão poucos os que este ano a F1 está a ser mais apelativa e interessante. Eu acho. E das várias conversas que tenho, há um denominador comum. “A F1 já não é o que era e antigamente sim era bom”. “Depois que o Senna morreu, perdi o interesse por isto”. O que se segue é apenas a minha opinião. Vale o que vale.

Há um inegável antes e depois de Senna no cenário nacional da F1 (e provavelmente internacional também, mas que se nota mais cá). As corridas deixaram de ser seguidas com tanto interesse. E a “era Schumacher” veio tirar o pouco brilho que restava à categoria rainha do automobilismo, isto aos olhos dos portugueses. O alemão que desafiou Senna ganhava sucessivamente. Factores mais que suficientes para desanimar os fãs. Por todos os países em que a F1 é assumidamente um desporto popular, com mais ou menos flutuações, o gosto pela modalidade mantém se.

Mas a F1 mudou e mudou muito desde esse tempo. Já lá vão 20 anos e ainda assim, as pessoas vão buscar os gloriosos anos 80/90 para relembrar a F1. Dizem que estas mudanças todas descaracterizam a modalidade. Mas será que a F1 está assim tão diferente?

Como dizia Jack o Estripador, vamos por partes:

Os carros:

Continuam a ser rápidos, são menos ruidosos e isso de facto é um handicap. A evolução retirou-lhes a fúria do grito dos V8. Mas já antigamente os V10 foram calados e a onda de criticas foi grande. Não há como fugir que o som deste ano é menos apelativo. Mas é um aspecto que pode e deve ser minimizado. O impacto sonoro tinha muita importância no espectáculo.

A questão dos motores é irrelevante. Já foram usados motores 1.5 no passado. O uso da energia eléctrica não me causa nenhum transtorno também, desde que nunca se abdique dos motores de combustão. E penso que a influência das grandes empresas petrolíferas que investem muito dinheiro, fará que isso não aconteça  tão cedo.

Há pessoas que dizem que hoje em dia a F1 só vale pelos carros e que os pilotos não são importantes. O problema é que sempre foi assim. Os Lotus ganharam campeonatos graças ao engenho de Colin Chapman. Os McLaren de Prost e Senna eram os melhores carros do grid por larga margem. Os Williams de Mansell e Prost igual. Foram muito poucos os carros que não eram muito melhores que os outros que venceram o campeonato. O carro sempre foi um factor importante. Mas os pilotos também. É certo que a tecnologia ajuda bastante hoje em dia mas, assim como ajudou no passado e ninguém duvidou do talento dos pilotos desse tempo, é injusto desacreditar no talento dos pilotos do presente quando tem de lidar com outro tipo de desafios. Novos tempos novas exigências. Há de facto, infelizmente, demasiados pilotos que não deviam estar na F1 e que estão porque têm as carteiras cheias. Talvez no passado esses piloto tivessem mais dificuldade em subir à F1 ( embora os pilotos maus sempre existiram em todas as categorias). Mas é uma diferença mínima. Os bons serão sempre bons e os maus não serão melhores graças aos carros. Talvez disfarcem melhor mas é sol de pouca dura.

Os carros deste ano são mais lentos:

A ideia foi retirar-lhes apoio aerodinâmico de forma a dificultar a vida aos pilotos. A fórmula ainda não está bem afinada, mas tem proporcionado bons espectáculos com os carros de lado e os pilotos a suarem para os manter na pista. Era o que todos queriam, dar ao piloto mais importância. Mas já há muita gente a queixar-se que os carros são mais lentos. De facto são mais lento em curva mas compensam isso nas rectas. Não é um bom compromisso? Mais derrapadelas, mais velocidade nas rectas e mais espectáculo. E o custo de isto são 1 ou 2 segundos a mais no cronómetro. É verdade que há o problema de a F1 ser sempre a categoria máxima no que diz respeito à inovação. E perder tempo com diminuição de apoio aerodinâmico é estar a dar um passo atrás na tecnologia. Mas como a F1 tem também de ser um espectáculo e como tal, cria-se uma dificuldade enorme em estabelecer um equilíbrio. Por agora fez-se diminuir a importância da parte da aerodinâmica e apostou se mais na parte mecânica. Sinceramente gosto que a F1 se mantenha o mais avançada possível, mas se ao retirar um pouco desse avanço se aumenta a espectacularidade… nada contra. As pessoas pagam bilhete para ver espectáculo e ultrapassagens e não uma mostra de tecnologia. A tecnologia tem de estar ao serviço do espectáculo.

É sempre a mesma coisa e acaba sempre por ganhar o mesmo:

A F1 pagou cara a factura da hegemonia de Schumacher. Nesse tempo em que a F1 se tornou algo enfadonha, perderam-se muitos fãs (embora as lutas com Hakkinen fossem interessantes). Mas esse tempo é passado. Desde então tivemos Ferrari, McLaren, Renault, Brawn GP, Red Bull a vencer o campeonato. Tivemos campeonatos discutidos até ao final ( 2007, 2008, 2010, 2012). Obviamente que a Red Bull conseguiu vencer 4 anos seguidos. Mas desses 4 anos apenas 2 foram ”à vontade”, ao contrário do que muitos pensam. E isso de épocas de domínio, até no passado existiram. A McLaren venceu 4 campeonatos seguidos, um deles em que venceu 15 das 16 corridas. Estiveram desde 1984 a 1991 no topo da categoria. A Williams dominou de 1992 a 1997. Nos anos 70 o domínio, embora mais repartido, caiu tendencialmente para a Lotus. A F1 sempre foi feita de época de domínio por parte de alguma equipa.  Recorre-se ao passado para relembrar a competitividade mas bem vistas as coisas se calhar a diferença para o presente não é tão grande.


Há de facto muita coisa que devia ser alterada na F1. Mas na semana passada ao ver a corrida de DTM, com o Carlos Mota e um colega nosso, reparei o que falta à F1 e o que as pessoas têm saudade. Um piloto que apoiam incondicionalmente. A parte emotiva da coisa. Para mim ver uma corrida de F1 é sempre um motivo de alegria, mas para os menos “fanáticos” falta algo. Falta um piloto que possam apoiar. A grande diferença entre a F1 do passado e do presente é que antigamente torcia-se pelo Senna, ou pelo Prost, ou pelo Piquet. Hoje em dia isso diminuiu. O carácter, a forma de estar dentro e fora de pista dos pilotos de hoje em dia, é muito diferente. A aura de um piloto no passado era quase tão importante como o seu rendimento. Actualmente o desporto é mais clínico. É menos dado a figurões. O único que existe é Raikkkonen e por causa disso, tem a legião de fãs que se conhece. 

A grande diferença entre o passado e o presente, é que faltam pilotos com os quais as pessoas se possam identificar. Que possam festejar cada ultrapassagem como um golo. Cada vitória. A visão desapaixonada da F1 é que está a retirar a espectacularidade. Não significa que os pilotos do presente sejam piores…Pelo contrário penso que em alguns casos são melhores. Tem é menos alma. Menos chama.

De resto. Os ingredientes são os mesmos. Mas faltando a parte humana… as pessoas menos apegadas ao desporto terão sempre tendência a afastar-se e relembrar os velhos tempos, nunca lembrando que a única coisa que de facto distingue uma época da outra… são os pilotos carismáticos que hoje em dia são uma raridade. Vamos ver se alguém aparece que possa trazer a chama de volta. Não gostando de fazer este tipo de paralelismo é como no futebol… Há muita coisa má no mundo da bola, mas as pessoas continuam a ver porque tem o clube que apoiam.  E esse gosto faz esquecer os defeitos que o desporto tem. Quando não há paixão começa-se a ver os aspecto mais negativos.

É claro que há outros factores que devem ser vistos. As pistas que ficam longe dos fãs, a insaciável vontade de ganhar mais dinheiro por parte de quem manda na F1, o constante esquecimento dos fãs por parte das autoridades que regem a F1, as corridas em que as ultrapassagens ficam um pouco manchadas pelo DRS, que torna as coisas demasiado simples (o DRS é uma solução boa, mas facilitar em demasia as ultrapassagens não beneficia o espectáculo), a quantidade exagerada de dinheiro que se gasta e que aumenta o fosso entre grandes e pequenos… Há várias coisas que era necessário repensar para que a F1 possa dar um passo em frente. É sempre possível melhorar. Mas não estamos tão longe quanto se possa pensar.

 Se tivéssemos alguém por quem torcer verdadeiramente tudo isto seria esquecido. Como torcemos por Félix da Costa na semana passada. Queriamos lá nós saber dos pormenores menos positivos... Queriamos que aquele BMW ultrapassasse todos os carros e mais que uma vez, para que no final cruzasse a linha em primeiro. E vibramos com isso. Como se fazia no passado na F1. Antigamente é que era, não porque a F1 era melhor… Mas sim porque as pessoas tinham por quem torcer verdadeiramente e assim davam asas a paixão pelo desporto.  



Fotos:
retiradads de google.pt

Fábio Mendes

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